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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Raul Werner Max Lepper.

                     Lepper Special, único exemplar produzido por Raul Werner Max Lepper.







Apaixonado por motores e velocidade
Pioneiro no automobilismo catarinense, Raul Max Lepper construiu o carro dos seus sonhos.

Com 76 anos de vida, Raul Werner Max Lepper acumula histórias que poderiam encher um livro. Apaixonado por motores e velocidade, este pioneiro do automobilismo catarinense pilotou os veículos mais velozes de seu tempo, solucionou problemas para os quais a engenharia européia não tinha conserto no Brasil e construiu o carro de seus sonhos, um automóvel que se tornou também o carro dos sonhos de muita gente.
Aos 13 anos, Lepper já dirigia e metia a mão nos motores para melhorar a performance do velho Chevrolet do pai e mesmo de outros carros. Em 1942, aos 18 anos, formou-se na primeira turma de aviadores do aeroclube de Joinville, seguindo direto para São Paulo para fazer um curso de aperfeiçoamento em biplanos e acrobacias no Campo de Marte.
Foi lá que descobriu a paixão de voar baixo, fazendo poeira nas estradas: "Descobri os carros de velocidade e achei o automobilismo muito mais sensacional, então fui ficando em São Paulo mais um tempo", recorda.
De volta a Joinville, Lepper abriu uma oficina mecânica onde passou a pôr em prática, profissionalmente, todo o conhecimento que adquiriu na garagem de casa. Em meio aos racionamentos impostos pela economia de um Brasil envolvido na Segunda Guerra Mundial, um dos feitos do talentoso mecânico foi mudar o sistema de combustão do seu Chevrolet 1939 para que funcionasse à base do gasogênio resultante da queima de lenha e de carvão.

Quatro anos depois de encerrado o conflito, Lepper casou-se com Margot, com quem teve as filhas Eliane e Regina.
Foi só em 1952 que Raul Lepper estreou no circuito de competições da região Sul como piloto. O Citroën que queimou borracha pela primeira vez no antigo campo de aviação de Joinville logo estava correndo pelas estradas poeirentas do interior do Estado, do Paraná e do Rio Grande do Sul. Naquele tempo, seu carro entrava na pista com poucas adaptações mecânicas e, em terras gaúchas, foi superado por veículos mais potentes, providos de motores especialmente preparados para vencer. O piloto voltou para casa entusiasmado e montou, ele também, a sua própria "carretera".


O bólido -um Ford V8 envenenado - ostentava na lataria reclames dos produtos fabricados em Joinville e representou Santa Catarina na tradicional prova das mil milhas de Interlagos entre 1956 e 1961. A corrida durava cerca de 16 horas e exigia revezamento de pilotos em carros que atingiam uma velocidade máxima de 190 km/h.
Lepper, em sua melhor atuação, cruzou a linha de chegada em oitavo lugar no ano de 1959. "Eram 40 participantes, todos com equipamentos poderosos, então me dei por satisfeito", admite.
Paralelamente às corridas, Lepper começou a projetar e construir seu sonho sobre rodas: um cupê esportivo de dois assentos impulsionado por motor Lincoln de 12 cilindros em V, carro montado sobre chassi criado pelo mecânico, com metais cromados no Rio de Janeiro e peças como os faróis, instrumentos de painel, vidros, volante e maçanetas cuidadosamente escolhidos em lojas especializadas. "Era um desafio que eu estava comprando. Não medi gastos para pôr em prática as minhas idéias de aerodinâmica como a frente baixa e a penetração em flecha", explica Lepper, lembrando dos três anos de trabalho até que finalmente pudesse rodar com o veículo, em 1957. Batizado de Lepper Special, o automóvel desenhado pelo joinvilense exibia linhas bastante arrojadas para a época, bancos em couro vermelho e lataria bege trabalhada a mão, em aço, pelo melhor funileiro da Nielson.
Criador e criatura foram destaque na imprensa local e ganharam a atenção das principais revistas de circulação nacional daquela época.
O sucesso do Lepper Special rendeu ao seu projetista o convite para trabalhar na primeira fábrica da Volkswagen no Brasil, em São Bernardo do Campo. Em 1960, mesmo ano em que construiu uma chata movida a hélice parecida com os barcos usados em banhados e terrenos pantanosos, Raul Lepper deixou a família e a oficina para se tornar o técnico que rodava as revendas do País resolvendo qualquer problema que surgisse nos modelos Volks. Foi Lepper, por exemplo, quem pôs fim a um misterioso ruído que incomodava os proprietários do recém-lançado Fusca, sugerindo a adoção de correias maiores no motor, idéia que teve lembrando de antigos conceitos mecânicos da aviação. "Mexer em motores e falar alemão eram coisas muito naturais para mim. Fui convidado para trabalhar na empresa por um ano e fiquei vinte, até me aposentar", lembra.
A partir da década de 70, o flamante Lepper Special passou a ficar a maior parte do tempo parado na garagem. Além de consumir muito combustível, tinha sempre como substitutos os modelos mais novos da Volks que Raul Lepper trazia para casa. Foi sendo desmontado aos poucos e sua carroceria acabou sendo vendida para se transformar num conversível. O mecânico passou muitos anos sem saber do paradeiro da sua jóia motorizada, até o melancólico reencontro. "Dia desses, descobri os restos dele em um ferro velho do Boa Vista, todo enferrujado. Teve um fim muito triste", lamenta.
Com tempo só para si e suas paixões, Lepper decidiu aproveitar a aposentadoria rodando o mundo na companhia da esposa para conhecer o que de mais moderno estava sendo desenvolvido na tecnologia automobilística. "Dediquei-me a pesquisar na fonte os grandes carros europeus", explica. "Visitei várias fábricas e conheci todos os circuitos da Fórmula 1, com exceção da Inglaterra e da Bulgária." Em Paris, Lepper comprou um Citroën BX com suspensão inteligente e, com ele, pisou fundo na pista de Nurburgring, na Alemanha, revivendo as mesmas sensações de um passado que nem pensa em sepultar. O veterano acabou de vender um Santana e está de olho em um Mercedes preto do qual prefere não falar para que ninguém o compre antes. Num dos test drive que fez com o carro, não se conteve e deixou que a velha gana de piloto afundasse o pé no acelerador, apavorando o vendedor que o acompanhava. "Não tem jeito, minha paixão é mesmo a velocidade",afirma.

Transcrevo a seguir texto sobre o veículo e seu criador, possivelmente publicado no jornal A Notícia em 2001: Agradeço à família o envio do material, em especial ao seu bisneto Luiz.